Quase cinco anos depois dos últimos posts, a inspiração voltou e retorno com as postagens aqui e no instagram @ruasestranhasdesp! Deu tempo até de mudar de profissão – por isso, tenho que conciliar os garimpos urbanos com audiometrias e tarefas do meu projeto de mestrado em Fonoaudiologia.
Graças à minha dica, quando este blogueiro foi entrevistado pelo Edison Veiga, então no Estadão , e depois relembrado em matérias mais recentes do blog São Paulo São e do IG, em julho último, sabemos que o Banco de Nomes da Prefeitura paulistana foi alimentado por uma alegre equipe de estagiários “ripongas” com todo tipo de fonte entre os fins dos anos 70 e início dos 80.
Para ganhar um dia de folga a cada 100 nomes cadastrados, nossos guerreiros usaram DE TUDO: de catálogos de artífices mineiros do século 17 a lista de políticos paranaenses, fortificações do Brasil-colônia, nomes históricos da Argentina e muitas, mas muitas listas de composições eruditas (só de uma única artista, a Lycia de Biase Bidart, são 17!), passando por nomes de atores do cinema mudo (inclusive uns que não existem!). Ou ainda, todos os verbetes “aproveitáveis” dos finados Almanaque Abril e enciclopédia Barsa. Até para lista de plantas medicinais e a tabela periódica sobrou! Isso você pode descobrir fuçando no arquivo do blog, não é?
Dizem os artífices do Banco de Nomes, entre eles o arquiteto Benedito Lima de Toledo, falecido neste ano, que a ideia era criar “manchas urbanas” com um tema. Em alguns bairros, deu certo – caso, por exemplo, da região da Penha batizada com nomes de partes do corpo humano em língua indígena (!) ou da região de São Miguel Paulista em que pululam os nomes de ervas e plantas, como a Avenida Mimo-de-Vênus. De resto, foi uma bela “Zo Wada” : diz o Dirceu Rodrigues, um dos ex-estagiários, que a rua do Estilo Barroco, a antiga Quinze de Novembro de Santo Amaro, ganhou este nome porque lá morava o Jânio Quadros (e, por pouco, a Henri Dunant, travessa da Barroco, não virou rua da Ficção Científica! – mas aí já acharam esculhambação demais…).
Mais de quarenta anos depois do início da tarefa, ainda há ruas para batizar – e as fichinhas dos nossos meninos, hoje já sessentões, ainda não acabaram! Com o tempo, a tarefa ficou com o Arquivo Histórico, que passou a cadastrar novos nomes. Há iniciativas como o Ruas de Memória, criado na gestão do Haddad, que prevê batismos relacionados aos direitos humanos – e substituindo nomes de pessoas ligadas à ditadura militar (por exemplo, o Elevado Costa e Silva que virou Elevado João Goulart). Em tempos em que Ustras são glorificados, é mais do que necessário. Outra fonte “recente” do Banco de Nomes têm sido artistas falecidos – talvez porque sejam mais “unânimes” como homenageados. No Jardim São Francisco, Zona Leste quase limite com Mauá, foram parar vários globais que nos deixaram nos últimos anos:
Além do Wilker, do Paulo Goulart e do Walmor Chagas, temos os cantores Jair Rodrigues, Mercedes Sosa e Cesária Évora – além do escritor Ariano Suassuna.
Em abril deste ano, por exemplo, o conjunto habitacional Santana do Agreste (ele próprio já homenageando a terra da Tieta), no Itaim Paulista (ZL), teve suas ruas legalizadas e batizadas com os nomes de artistas já falecidos há algum tempo, como os atores Cláudio Correa e Castro (morto em 2005), Marly Bueno (falecida em 2012) e Marcos Cesana – este, mais conhecido por suas participações em inúmeros comerciais e no filme Bicho de Sete Cabeças. Já outros nomes, como a atriz Lílian Lemmertz (1936-1986) e o cartunista Henfil (1942-1988) até hoje esperam sua vez…
Ou ainda, pessoas que morrem de maneira trágica, como o grande médico Roberto Kikawa, criador do projeto Carretas da Saúde, assassinado num assalto no Ipiranga em 2018, homenageado com uma travessa da Rua Butantã recém-aberta em Pinheiros.
Isso significa que o Banco tomou jeito? Claro que não!
Só este ano (2019) já tivemos legalizadas, dentre tantas:
– a Travessa Signo, em São Miguel – nome de um poema de Drummond;
– a Travessa Lobito, no Morro Doce – nome de uma cidade angolana;
– a Praça Harmonia e Melodia, na Vila Andrade (nesta, o Banco é inocente: o nome veio por conta dos condomínios do entorno, que homenageiam músicas de Tom Jobim).
Fora ruas como a Zé Pretinho (Itaquera) e a Travessa Francisquinho (Capão Redondo), batizadas por vereadores e que relembram carinhosamente moradores antigos das quebradas.